quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Entrevista com anarquista grego

OS ANARQUISTAS E A REVOLTA SOCIAL NA GRÉCIA


Alexandros Grigoropoulos, jovem anarquista morto pelas forças policiais.

Como nenhuma mídia do poder pode ocultar a Grécia vive desde o dia 05 de dezembro um cenário de revolta popular marcante na história recente da Europa. Dias de fúria social contra os aparelhos repressivos, a classe capitalista e um governo cambaleante pela crise que assusta todo o mundo e joga a conta no emprego e nos direitos sociais dos trabalhadores, os imigrantes e a juventude. Publicamos aqui uma entrevista produzida pela página web espanhola Kaos en la Red com um companheiro anarquista grego que nos faz um quadro geral das lutas e da intervenção libertária nesse processo popular.

Kaos en la Red entrevista a Yannis Androulidakis, Secretario Internacional do Sindicato grego, ESE (anarcosindicalista)



1. Em que outras cidades além de Atenas, se efetuaram manifestações de protesto?

As revoltas se acendem por todas partes na Grécia. Incluso nas pequenas cidades, em todos os departamentos do país houveram manifestações, senão é só ver os motins contra a polícia. Eu cito Tessalônica, as 3 grandes cidades de Creta (Héraklion, Hania, Rézymno), Yannena, Agrinio, Patras e Komotini (duas cidades onde tiveram operações comuns entre a polícia e os grupos neonazis), Larissa (onde se acusou um garoto de 14 anos pela lei antiterrorista), Trikala, Kerkyra, Lesvos etc


2. Onde tem sido mais grandes as mobilizações?

Em Atenas há numerosas "Manis" (manifestações N.T.) todos os dias convocadas por diversos coletivos, ou inclusive chamados por Internet ou SMS. Os alunos de segundo grau cercam todo dia as estações da polícia em toda a cidade. No centro da cidade há três universidades ocupadas por militantes (Escola Politécnica, Escola de Economia e Escola de Direito) Poderiamos dizer que estas três ocupações compõem a coordenação do movimento enquanto se refere aos adultos. Pelo que se refere aos estudantes de ensino médio, se podem observar formas de organização completamente novas, horizontais e formidáveis. Atualmente há ao redor de uns 800 institutos ocupados na Grécia.


3. Se pode falar de levantamento popular ou se exagera esta afirmação?

Não somente se pode falar de um levantamento popular, se trata da maior rebelião na Grécia desde, ao menos, finais de 1965, provavelmente uma das maiores rebeliões no mundo ocidental desde o Maio de 68 em Paris. Tem que ser destacado que não se trata de uma rebelião de "militantes", ainda que o movimento de esquerda, de extrema-esquerda e sobre tudo dos anarquistas são bastante fortes no país, não se trata tampouco de um movimento dos marginalizados (como em Los Angeles em 1992 ou Paris em 2005), tampouco uma rebelião da "juventude". Gente de todas as idades e de diferentes camadas sociais tem saído às ruas a se enfrentar com a polícia. À ponto do “black block” (muito forte na Grécia), pareça uma força moderada nas ruas. É a cólera social de muitos anos, possivelmente destes 34 anos de república grega, que saiu às ruas.


4. Qual o papel desempenhado pelos estudantes na origem do protesto?

É difícil distinguir os distintos grupos sociais. Os estudantes de 14 a 16 anos são talves os mais visíveis, estão todos os dias nas ruas, fazem 2 ou 3 manifestações, atacam todos dias vários postos policiais. Às vezes vamos acompanhá-los por temor, para não deixar crianças diante de gente armada, ainda que se trate de uma nova politização que às vezes não comparte os mesmos temores sobre a violência popular. O que costumamos chamar na Grécia “ignorância do perigo”. Os estudantes, por sua parte, tentam vincular esta rebelião com suas próprias pretensões e serão a próxima “bandeira” do movimento, provavelmente.


5. - Os jovens do sexo masculino são o núcleo dos protestos? Qual o peso que tem os diferentes componentes do anticapitalismo nestas (anarquistas, comunistas, etc)?

Quem quer que diga que "dirige" este movimento é um mentiroso. Se bem tenha sido acendida pelos anarquistas de Atenas, esta rebelião, de súbito, foi esponteamente seguida por todas as identidades políticas. As idéias e os coletivos anticapitalistas foram bem reforçados durante estes dias. Poderíamos distinguir as três ocupações de Atenas, a Escola Politécnica está nas mãos dos anarquistas “puristas” (o que não quer dizer grande coisa atualmente), a Escola de Economia é um lugar em que o anarquismo-luta de classes está muito presente (os comitês de trabalhadores foram ao seio desta ocupação para ir aos lugares de trabalho e discutir com os operários) e a Escola de Direito agrupa a parte maior da extrema esquerda. Resta acrescentar que no que concerne à esquerda parlamentária, o Partido Comunista (sempre stalinista) denuncia a “rebeliãodice” dos “provocadores”, ao mesmo tempo que partido “Synapismos” (Esquerda Européia), participa da manifestação sem tomar parte em nenhum processo do movimento.


6- Como avalias o seguimento da recente greve geral?

A única central oficial do país, GSEE, é históricamente culpada por sua ausência neste movimento. Esta ausência da maior rebelião destes 50 anos assinala a derrota e a falha do sindicalismo estatal e burocrático. A greve do 10 de dezembro foi proclamada antes do assassinato do companheiro Alexandros, para reivindicar medidas contra a crise. Então o GSEE tem que decidir (depois de um pedido do primeiro ministro) se anula a manifestação de protesto para não participar do motim! Este comportamento se opõe aos interesses populares e operários, avança à colaboração de classe contra a luta de classes. Denunciamos esta política de traição do GSEE e reiteramos a necessidade urgente de uma nova confederação sindical na Grécia. Acrescento que a pesar do GSEE, várias dezenas de milhares se manifestaram em Atenas e em outros lugares, sob o chamamento dos coletivos operários, as ocupações e certas uniões. A participação na greve foi bastante grande também, visto que uma grande parte do processo produtivo estava já cortada no país.


7-Qual o papel que jogam os meios de comunicação gregos? A nível internacional, os meios de comunicação falam de “vandalismo”.

Os meios de comunicação desempenham papel de “véu escuro”. Várias vezes publicaram mentiras sobre “vandalismos” que nunca aconteceram (biblioteca nacional queimada, academia destroçada, possivelmente amanhã poderão falar de demolição do Pantheon) ou se difundem rumores que há um pedestre morto por uma pedra.

No dia seguinte dizem: “éé, sim, isto nunca aconteceu antes, tu vê... É que com a bagunça de ontem, tivemos estas informações”. A realidade é (posso assegurar isto pessoalmente como jornalista), que de tais “informações” escapam todos os dias da polícia e depois os meios de comunicação as reproduzem sem o menor controle. Outras vezes, os meios de comunicação falam que anarquistas na França, na Espanha e na Itália já estão a caminho para ajudar os anarquistas gregos. Mas que outra coisa se pode esperar dos meios de comunicação oficiais, já que seus proprietários são os mesmos capitalistas que exigiram a política econômica que motivou esta rebelião? Acrescento que as agressões da polícia durante estes dias (disparos, torturas, etc.) estão sempre presentes nas páginas web alternativas como a athens.indimedya.org, indy.gr e os meios de comunicação só o reproduzem quando já estão conhecidas. Passou o mesmo com o assassinato do companheiro Alexandos.


8- É normal este comportamento da polícia grega?

O Comissário do Conselho da Europa T. Hamarberg (suponho que não seja anarquista...) denunciou a violência excessiva e permanente da polícia grega, na medida em que a polícia goza de impunidade diante dos tribunais. Por último, se propôs o desarme da polícia grega por razões de segurança. Desde o assassinato do camarada Alexandros tivemos 400 feridos, pelos disparos “às cegas” que se realizam todos os dias, dezenas de manifestantes feridos pela tortura da polícia.


9- Como podemos analisar o assassinato deste jovem de 15 anos? É talvez o começo de uma aumento da repressão que se aproxima?

O companheiro Alexandros não foi a primeira vítima da violência policial na Grécia. Desde a transição política (1974) temos por volta de 100 mortos por disparos da polícia grega. Os ativistas, imigrantes, ciganos, jovens, descapacitados, inclusive crianças! Faz três anos, a polícia começou em Exarheia um assalto a este bairro de Atenas com uma longa história militante. Mas não se pode esquecer que a repressão estatal é cada vez maior com a repressão econômica, a pobreza, etc. Em uma Europa que requer 70 horas de trabalho semanal aos trabalhadores, a repressão é o único “argumento” dos empregadores e dos estados. Por tanto, estamos em um período de grande repressão em todo o mundo.


10- O sindicato que você representa pede a demissão do governo grego?

Em primeiro lugar, temos que dizer que o sindicato SEA Atenas não tem processos iniciados foram do que está sucedendo. Estamos todos em assembléias e suspendemos toda a “vida orgânica”. Não somos uma parte que vai separadamente a organizar uma revolta. Somos um pedaço da revolta, nossa vida é o ativismo nas ocupações e as assembléias. Nossas demandas são as das Assembléias. Sobre a tua pergunta, não acreditamos que uma mudança de governo pode mudar nossas vidas. Necessitamos uma mudança de desistema econômico. A assembléia da ocupação da Escola Econômica, chamou ao desarme da polícia e a supressão das forças especiais.

Depois de tudo, se o governo cair será por causa de uma revolta que demonstrará que as pessoas têm a capacidade para ganhar o poder.


11- Como se põe em ação o movimento anarquista em suas diversas correntas nas lutas e protesto?

Os anarquistas foram os primeiros que acenderam a revolta, na noite do assassintado de Alexandros. Eles participaram em todas as ações de rua e asseguraram que a ira e a violência das pessoas se movesse em direção aos bancos, às multinacionais e às comissarías de polícia e não aos pequenos comércios e automóveis. Não devemos esquecer que a polícia secreta fez esforços par converter os distúrbios em uma “violência cega”. Mas não tiveram êxito.

Por outra parte, são os anarquistas que operam em todas as ocupações. Pessoalmente sou parte de um núcleo que exige que os trabalhadores se envolvam abertamente nas ocupações, como é o caso visível dos ativistas da ocupação da Escola de Econômia..


12- Como afeta a Grécia a crise econômica?

Inclusive antes da crise, a situação na Grécia era bastante difícil. De maneira que, a partir de 1996 os políticos falam da “poderosa Grécia”, referindo-se à capital do negócio dos Balcãns, quando dos jogos olímpicos. O salário mínimo não excedia de 650 euros, enquanto existia uma grande precariedade entre os jovens, especialmente. A maioria das pessoas e das famílias têm grandes dívidas devido à investida dos bancos na economia grega. Depois do Crack, os patrões começaram a despedir “para reduzir os custos”, aumentou a incerteza, mas também a ira das pessoasl existe uma grande precariedade antes de la crisis, la situación en Grecia era bastante difícil.


13- Você acredita que estes fatos também estão vinculados com a crise capitalista internacional?

Como disse, sim. A crise aumentou a ansiedade e a ira das pessoas. Também reforça o sentir de que não podemos confiar nos amor deste mundo e que nossa emancipação chegará através de nós mesmos.


14- O que você espera destas mobilizações?

As mobilizações sempre dão resultados inesperados. A realidade já superou muitos planos e projetos das organizações e ativistas. Mas por outro lado, este movimento não se fez, até o momento, demandas concretas. Pessoalmente, o que espero é sair deste novo movimento com estruturas de trabalhadores, os sindicais, sociais e populares mais organizadas e mais concretas na luta. Mas, tendo em conta o que está acontecendo na Grécia, também espero que a realidade seguirá sendo superior a nossas expectativas. Já vivemos aqui e podemos fazê-lo de novo. Não se pode esquecer que há uma inteligência que supera a inteligência de todos os gênios. E é a inteligência coletiva do mundo, é a inteligência das pessoas saindo Às ruas para restabelecer a vida.



Fonte: FAG

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