quinta-feira, 12 de julho de 2007

Ocupação na UFAL - ensinamentos

O MOVIMENTO DE OCUPAÇÃO DA UFAL – ALGUNS ENSINAMENTOS


Ocupando a REI-toria...

Tendo durado sete dias (de 24 a 31 de maio), a ocupação foi organizada pela Frente de Luta Contra a Reforma Universitária e pelo Movimento Terra, Trabalho e Liberdade (MTL), possuindo depois a adesão do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o apoio da Comissão Pastoral da Terra (CPT), além das diversas entidades e sindicatos (como a dos docentes da Ufal). Esteve inserida já num processo de lutas a partir do calendário da Semana de Luta Contra a Reforma Universitária realizada na UFAL que teve, entre outras coisas, a distribuição gratuita de alimentação do Restaurante Universitário.

A ocupação não contou, e nem poderia, com o apoio da atual diretoria do DCE, ligada à partidos do Governo Lula (UJS-PCdoB e DS-PT). Não só isso, seus diretores tentavam deslegitimar a luta, questionando sua “representatividade”. Um ato que envolvia centenas de estudantes e militantes já respondia por si, mas depois de uma das maiores assembléias estudantis dos últimos anos da UFAL com mais de 550 estudantes e do apoio do Conselho de Entidades de Base (CEB), a legitimidade do ato tornou-se indubitável.

As pautas da ocupação da Reitoria foram construídas em cima de questões já anteriormente postas pelo ME, como o Restaurante Universitário (RU) – iniciada na ocupação de 2005. O ato possuía uma entonação de denúncia e mostrava a relação das pautas levantadas pelo ME na UFAL com o caráter privatista do processo, nacionalmente em curso, de Reforma Universitária. A pauta que unia os movimentos do campo, a Escola Agrotécnica de Murici, havia sido conquistada anteriormente no Conselho Universitário (maior instância deliberativa da UFAL). Naquele momento o ME e os movimentos de luta pela terra reverteram, em intervenção no Conselho Universitário, seu caráter de produtora de mão-de-obra (barata, inclusive) para a indústria canavieira de Alagoas, em uma escola com ênfase na agricultura familiar. Porém o Grupo de Trabalho que seria responsável pela elaboração do novo projeto não tinha sido convocado. A suspeita, confirmada durante a ocupação quando encontramos o “novo projeto”, era que a reitoria o vinha construindo “por baixo dos panos” sem a participação dos estudantes e trabalhadores rurais organizados, com a latente intenção de retomar o caráter latifundiário e sucro-alcoleiro.

Ao fim da ocupação todas as pautas foram ganhas. Como toda luta, incorpora-se ao movimento também as experiências vividas e seus ensinamentos. São delas que trataremos.


“A luta vem, a UNE some... não fala em nosso nomel”

Recentemente o Movimento Estudantil nacional protagonizou grandes momentos na luta contra o Governo Lula, através de uma série de manifestações e, sobretudo, atos de ocupação das reitorias das universidades aliando suas pautas locais com a luta contra a Reforma Universitária do governo.

A importância histórica dessas mobilizações é que não só foi feita à revelia da governista UNE como também a desgastou frente aos estudantes. Claro que tais mobilizações em muito se deram através da formação da Frente Nacional de Luta Contra à Reforma Universitária que agrupa os setores da CONLUTE e também setores da UNE (FOE). No entanto, em todos esses anos de Governo Lula, nunca ficou tão claro que a UNE não fala em nome dos estudantes em luta. O melhor exemplo ocorreu na UFAL com o ato de protesto realizado durante uma “palestra” do presidente da UNE, Gustavo Petta, que reunia cerca de minguadas 15 pessoas em uma sala. Na oportunidade, o recado foi dado pelos estudantes ocupantes: a UNE é capacho do Governo Lula! E enquanto os estudantes lutavam contra Lula e as Reitorias pelo Brasil, a UNE sentava com estes, tentando deslegitimar as lutas que são incapazes de fazer. Não à toa que em meio à repercussão e força que ganhava as lutas estudantis nacional, que tinha como maior referência a ocupação da USP, a UNE convocou um dia de ocupações que foi tão armado quanto furado.

Mais uma vez a tese de que quando as entidades não dão fôlego à luta são superadas pelo próprio movimento se mostra verdadeira. Mais uma vez mostrou-se que a luta tem de ser feita quer as diretorias das entidades queiram, quer não. Os acontecimentos recentes foram a prova de fogo que a luta para derrotar a Reforma Universitária deve também implicar a derrota da política da UNE, de seus vícios e sua burocracia.


A aliança entre estudantes e trabalhadores e a reação da burocracia acadêmica

O maior diferencial da ocupação da Reitoria certamente foi a aliança estabelecida entre o Movimento Estudantil e os Movimentos Sociais, dado a partir da pauta da Escola Agrotécnica. A importância desta pauta era tamanha porque dialogava diretamente com o caráter da universidade, além de permitir uma articulação tão necessária e tão pouco efetivada, dos estudantes e da própria universidade com a classe trabalhadora do nosso estado.

Se a universidade é um espaço policlassista isso não significa convivência “pacifica” entre classes e seus interesses. Com a ocupação e o enfretamento à submissão da produção do conhecimento às elites alagoanas, este antagonismo de classes foi acirrado. Mais do que nunca, a burocracia acadêmica, que muito se beneficia com as “trocas de favores” e a mercantilização da educação, se sentiram acuados. A reação conservadora veio através de articulações junto a departamentos e unidades acadêmicas para tentar derrotar o movimento, mas este soube utilizar seus instrumentos de mobilização e comunicação, mantendo-se firme com o apoio estudantil crescente.

A concepção de que a universidade deve não somente servir aos interesses da classe trabalhadora, mas efetivamente incorporá-los é fundamental para o avanço de nossas lutas. A importância histórica dessa aliança deve ser não só ressaltada, mas mantida, buscando-se sempre ampliar a predisposição do movimento estudantil em estar em luta conjunta com os trabalhadores, assumindo uma postura classista e fazendo da universidade mais uma trincheira na luta de classes.


Duas ocupações, duas táticas e duas vitórias...
o pensar estratégico para o acionar tático

Tendo em vista as inevitáveis lembranças e retomada de discussões da ocupação desta mesma reitoria na greve das federais de 2005 (que durou 19 dias), aproveitamos a oportunidade para discutir a importância de superar análises “ultimatistas”, que se caracterizam muitas vezes por não pensar, à luz estratégica, os instrumentos de luta do movimento e suas posições táticas. Estas devem também estar condicionadas a análise conjuntural, correlação de forças e a possibilidade de fortalecimento do movimento.

Assim como em 2005, a recente ocupação foi resolvida através de um acordo judicial. Durante a audiência de conciliação deu-se um impasse quanto à ampliação do RU, visto que a reitoria afirmava não poder estabelecer data para tal naquele momento. Isso representava uma grande flexibilização, já que esta era uma das pautas mais enfatizadas e que nos traria um ganho material imediato. A própria ocupação possuía um caráter mais de denúncia do que propriamente de reivindicação visto que tratava de pautas ganhas em momentos anteriores (como esta do RU), mas até então não cumpridas pela Reitoria. Como a mesma vinha descumprindo sistematicamente todos os acordos que havia estipulado com o ME, não amarrar data para a ampliação das vagas do restaurante era não amarrar data para cumprimento de acordo. Era não amarrar o próprio acordo. A maioria do movimento avaliou que a ocupação ganhara respaldo nos estudantes, apesar dos ataques dos setores conservadores da universidade, principalmente dos ligados à Reitoria. Nossa avaliação era de que apesar disso, a adesão estudantil era forte e o caráter de aliança com os movimentos dos trabalhadores dava uma entonação ainda mais firme e diferenciada ao movimento de ocupação. A Reitoria de fato estava “blefando” e desesperada, pois na verdade encontrava-se acuada.

A teoria revolucionária mostra que a via para as conquistas materiais e políticas para a classe trabalhadora, vêm através do conflito de classe e não da conciliação. A análise tática mostrava que o instrumento de luta ainda não estava desgastado, ao contrário, demonstrava vitalidade e deveria fazer valer sua força. O resultado foi que, em resposta à ação do movimento de manter sua posição sem “flexibilizar”, a Reitoria mudou de postura no decorrer da audiência, terminando por ter que ceder em todas as pautas. Foi a vitória da ocupação.

Porém, algo, além disso, deve ser avaliado e analisado mais profundamente. Na greve das universidades em 2005, o Comando de Mobilização Estudantil construiu uma ocupação também no gabinete da reitora que durou 19 dias, também encerrada em acordo judicial. Sem dúvida esta ocupação abriu um flanco que possibilitou as lutas de hoje pelo aumento de assistência estudantil. As pautas que haviam iniciado a ocupação em 2005 eram amplas e de resolução bem mais complicada, pois foi a partir daquele momento que se cavavam as lutas que serão retomadas nesta ocupação de 2007 (RU e taxas, por exemplo). Naquele momento, às vésperas da audiência com o juiz federal, assim como se deu no meio da audiência desta ocupação, deu-se um grande debate no seio do Movimento de Ocupação. A questão era quanto à pauta de taxas acadêmicas (emissão de documentos), onde se apresentava a discussão de flexibilizar neste ponto ou não, ou seja, se a extinção imediata de todas as taxas em juízo também era condição para o movimento ou não. Foi um debate árduo, que requeria maturidade tática, e cremos que a comparação com os fatos recentes é de fundamental importância para o amadurecimento do movimento. Nosso posicionamento, naquele momento, foi o de “flexibilizar nas pautas” (e aqui é realmente entre aspas, como veremos). Vamos então explanar as diferenças políticas e de conjuntura que levaram às diferenças de posicionamento de nossa organização.

Em primeiro lugar, a conjuntura naquele momento era completamente diferente. Naqueles tempos vivíamos uma greve e a dificuldade de comunicação tornava extremamente complicada mobilizar mais estudantes do que os que já estavam mobilizados. Não havia tendência posta de ascenso do movimento e mesmo que alguns setores se dispusessem a tentar mobilizar estudantes secundaristas, sua viabilidade era bem questionável. Outra diferença fundamental era o tempo que já havíamos passado ocupados e a limitação de pessoas que encontrávamos. Eram 19 dias com as mesmas 30 ou 40 pessoas se revezando, bem diferente das 100 pessoas que se revezaram por 7 dias, e com adesões freqüentes. A terceira diferença vem da própria pauta. As pautas da ocupação de 2005 estavam entrando naquele momento nas pautas do ME e de fato foram abertos flancos imediatos nas pautas para que a luta tivesse onde se constituir. Não só isso, proporcionou que a pauta do RU em 2007 tenha obtido ainda mais apelo e força. Ainda assim, um comparativo com a ocupação de 2007, pode mostrar que em 2005 os avanços conquistados naquele momento ainda foram maiores. Na própria questão do Restaurante, foram ganhas 300 comensais no almoço e projeto de RU para todos dentro de prazos estabelecidos. Não foram cumpridas.

Em 2007, basicamente a mesma coisa foi conquistada (ainda um pouco menos quanto ao número de comensais). Também pode não ser cumprido. No entanto, com um acúmulo de duas ocupações em dois anos, o ME tem, em tese, muito mais poder de barganha para fazer no real, as conquistas expressas no papel (ganhas na luta). E as taxas? Em 2005, após a ocupação, a mobilização para o Conselho Universitário (CONSUNI) extinguiu as taxas para alunos de instituições públicas de ensino. Uma vitória parcial, já que a pauta era o fim integral delas. Em 2007, quanto a essa pauta específica, nada foi avançado na ocupação, até porque o conteúdo da pauta nesta ocupação era cobrar da universidade o rigoroso cumprimento da norma deliberada pelo CONSUNI, tendo em vista as denúncias recebidas de cobrança que estariam sendo feitas e a pouca visibilidade desta informação para a comunidade acadêmica.

Com tudo isso, podemos até dizer que as pautas de 2005 como as pautas de 2007 acabaram sendo um pouco destoantes com a capacidade de mobilização demonstrada, principalmente a última que dada a força que o movimento ganhou as pautas apresentadas ficaram, em certa medida, um pouco tímidas. Mas a grande questão aqui é a importância de se pensar as táticas do movimento, sem perder o olhar estratégico. A ocupação de 2005 possibilitou a ocupação de 2007 na UFAL, tanto na abertura das pautas, quanto na preparação e na construção da militância estudantil. Não existem táticas pré-concebidas e não é com base em “principismo” que avançamos. O que não quer dizer que vale qualquer coisa em qualquer ocasião. Trata-se de entender que a radicalidade das lutas está condicionada aos seus métodos e possibilidades de arrancar conquistas visando pensar além do imediato e de posições “ultimatistas”.

Cada luta é uma batalha e certamente existem batalhas que são mais decisivas, representando um marco. As ocupações da Reitoria fizeram parte desse tipo de batalha. Mas uma batalha entre tantas outras maiores ainda a serem feitas. O lastro deixado é com as lições trazidas, que devem servir de ferramenta para o avanço dos movimentos, rumando no sentido, inclusive, de superar o imediatismo das lutas para dar conseqüência e continuidade a elas. Para isso, a análise de momentos passados, a memória do movimento, é uma importante ferramenta de construção da luta. Essa é a lição que apresentamos. Aos companheiros e companheiras de ocupação e de luta, em todo Brasil, nossas saudações revolucionárias. Aos sabotadores governistas e burocratas de plantão nosso mais firme combate. Avante, sempre!


Comunicado de avaliação do CAZP, julho 2007

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