quinta-feira, 15 de maio de 2008

Conjuntura alagoana

Cenários de conjuntura alagoana
Coletivo Anarquista Zumbi dos Palmares
Alagoas, Maio de 2008

A presente análise de conjuntura é um exercício de militância que nos habilita na busca por um melhor entendimento do chão em que pisamos e que pretendemos transformar. Para quem visa um projeto de organização política com intenção revolucionária a ser desenvolvido em harmonia com a construção do Poder Popular das organizações de base, trata-se de um dever de casa.

Com humildade e dedicação, ir cumprindo com nossos “deveres” cientes de nossas limitações é também nos possibilitar a conquistar inserção social pelas bases. E sabemos que é somente isto que nos permite tanto ter uma análise mais concreta e ampliada da realidade, quanto cumprir com nossas intenções.

Em busca de financiamentos, Alagoas está à venda

O caneco de Alagoas sempre de prontidão a espera de financiamento vindo de fora nunca foi novidade. Hoje, em tempos neoliberais intensos, presenciamos a negociação da dívida pública de Alagoas com o Governo Federal, firmando o ajuste fiscal em parceria com o Banco Mundial (Bird), associada à discussão das estratégias da Agência de Fomento de Alagoas (Afal) em “cooperação técnica” com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (AECID).

Nos mesmos termos, está também a consultoria fornecida ao governo estadual pelo Movimento Brasil Competitivo, liderado por um dos empresários mais ricos do Brasil, Jorge Gerdau. Tem cumprido trabalho de já um ano, tendo ainda cerca de seis a cumprir. Sua atuação vai em concordância com as dos organismos internacionais, ou seja, “melhoria da competitividade das organizações privadas e da qualidade e produtividade das organizações públicas”.

Portanto, no que confere a gestão pública, vale a adoção de métodos e modelos de gestão ultra-liberal. Como se sabe, o que está em jogo é o enquadramento de Alagoas dentro de padrões e necessidades do jogo do capital. Nosso pequeno chão de terra, ainda que maltratado por séculos e que pouco acrescenta no Produto Interno Bruto (PIB) do país, não deixa de estar dentro das possibilidades de ganho por parte de investidores em vários ramos. Os recursos e paisagens naturais viram os atrativos e a sua privatização o objetivo. É nesse sentido que os citados organismos atuam, descobrindo as “potencialidades econômicas” de Alagoas.

Significativo é a área de turismo e que sempre teve sua parcela representativa na economia alagoana. A Agência Espanhola tem fornecido suporte para formação de planos de ação na área, no discurso de gerar emprego e renda. O que se assiste é a presença cada vez maior na área de: hotéis, bares e restaurantes de empresários europeus; especialmente presentes na área litorânea do estado, onde na esteira corre a especulação imobiliária e a mafiosa indústria da construção civil.

E não poderia deixar de ser atrativo para o capital, pois, é o dinheiro público a financiar infra-estrutura para usufruto do setor privado, nacional e internacional. Aqui, o dinheiro do PAC do Governo Federal, também cumpre papel catalizador no processo. O envolvimento e a participação da população local, como as que estão vinculadas ao artesanato e a pesca, atua tão somente como mão-de-obra (barata) ou agente econômico secundário.

Outro destaque fica por conta do anúncio da exploração de minério na cidade de Craíbas, região agreste, por parte da mineradora Vale Verde (filial da canadense Aura Gold Mineração). O governo de Téo Vilela (PSDB) fala de investimento da mineradora na ordem de R$ 400 milhões, com faturamento anual de R$ 200 milhões e começando a operar até início de 2011. A fase é de conclusão de estudos a respeito da produtividade do solo.

Na questão do impacto sócio-ambiental na região, o governo se comprometeu a não medir esforços contra o que eles chamam de “entraves burocráticos” e deve promover toda a estrutura de água e energia necessária para tal empreendimento (adutor e subestação de energia). A sondagem do terreno, feita já há mais de um ano pela mineradora, tem sido feita a sete chaves. O projeto teria sido comprado da então Vale do Rio Doce, que na década de 1980 constatou a presença na região de cobre, ferro e até ouro, mas nunca levou adiante. Quanto à população local, o único papel delegado é o de expectadores na promessa de 1500 postos de trabalho.

O agronegócio e os “heróis” da cana:
mais destruição de recursos naturais, mais concentração de riqueza

Quanto ao setor canavieiro, este enfrenta desde o fim do ano passado inusitadas greves por parte de trabalhadores do corte de cana e agora também uma ação do Ministério Público que tem autuado dezenas de usinas constatando o que é de conhecimento de todos: a presença de trabalho escravo.

No terreno mais econômico, a cana também pode não ter o mesmo peso no PIB alagoano como o de outros tempos, o que é resultado de uma diversificação na economia alagoana. Com dados de 2005, a capital Maceió concentra quase 50% onde, ainda que exista presença também na produção deste PIB do setor sucroalcooleiro, possui uma economia mais dinâmica que abrange setor químico, indústria civil e comércio e serviços. No entanto, em uma economia bastante voltada para as exportações, produtos relacionados ao setor permanecem sendo esmagadora maioria em suas estatísticas. Aliás, aqui cabe a nota que o setor domina o porto de Maceió e está a discutir um Plano Diretor para o mesmo com o governo estadual.

Em relação a ocupação de terra, o processo passado de reestruturação produtiva no setor sucroalcooleiro também o colocou ocupando uma área de terra menor que a agropecuária, mas sem perder sua produção. Isso muito devido a programas de melhoramento genético da cana, possibilitada a partir de parcerias como a da Universidade Federal de Alagoas, referência nacional no quesito.

Neste momento, onde diversos usineiros e grandes fazendeiros estão sendo notificados judicialmente, nota-se a maior incidência de outros setores na economia alagoana. Embora a concentração de terra pelo setor apareça menor em relação a outros (pecuária), não significa perda de espaço político-ideológico, nem muito menos uma mudança no quadro econômico do estado a se “emancipar” dos canaviais.

Na verdade, na questão da área ocupada de terra, o setor afirma que a agropecuária ocupa o dobro com área de pasto e que, pela parte dos usineiros, existe a preocupação em manter reservas de mata. A verdade é que as áreas de mata mantidas pelas usinas são irrisórias ao estrago que já fizeram ao longo de anos e que ainda fazem. Além do que, sabe-se que tal questão é feita na medida em que garante retorno financeiro, seja pela modalidade empresarial de “marketing social” até pelo fato de exigências de mercado estrangeiro.

Vale salientar que no fim de abril do corrente ano, o governo estadual lançou o “Programa de Reflorestamento e Desenvolvimento Sustentável em Alagoas”. Contando com a participação do polonês Ignacy Sachs, um dos formuladores do conceito de “desenvolvimento sustentável”, discutiu-se “modelos de negócios florestais” e “alternativas de culturas florestais”, tal como a inserção da agricultura familiar no processo e produção de energia (biocombustíveis). O parâmetro da discussão de “reflorestamento” é o mesmo que em outros estados, os quais têm exemplos, em que colocam a plantação de eucalipto (o “deserto verde”), como modelo de proteção ambiental e reflorestameto.

O fato é que o “desenvolvimento sustentável” em Alagoas é inseparável do contexto nacional da política de produção de biodisel. Lembrando que o presidente Lula, no ano passado, chamou os usineiros de heróis nacionais, pelo papel a desempenhar nessa política. Para estes “heróis”, que sempre viveram de concessões e benefícios do Estado, o momento não pode ser ruim.

Em Alagoas, o programa do governo estadual referente ao incentivo ao biodisel é ponta de lança em sua estratégia econômica e tem sido levado adiante como benéfico, inclusive, à agricultura familiar e como forma de fazer reforma agrária. O governo têm colocado como política de “incentivo” a agricultura familiar, mesmo em assentamentos, a distribuição de sementes de mamona, uma das matérias-primas dos biocombustíveis. A Secretaria de Agricultura e o Iteral (Instituto de Reforma Agrária de Alagoas) distribuiu, em março, sementes a produtores de 33 municípios de áreas tidas como ideais para o seu cultivo. Aqui temos tanto o fato de submetê-los a lógica do agronegócio como, evidentemente, os colocarem em agentes auxiliares de um processo de produção de energia finalizado nas usinas.

Cabe destacar que a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) foi reativada recentemente, em reunião realizada em Maceió com a participação de Lula. Este, em seu discurso, deixou claro que o principal papel do órgão é a produtividade agrícola e o biodisel, sendo o “passaporte nordestino” para a entrada em um “novo ciclo de desenvolvimento mundial”.

Da conclusão a se tirar é que a agroindústria da cana permanece a responder com preponderância no estado, sem excluir o avanço da pecuária, também no contexto de agronegócio e de outras atividades. Está inclusive bem posicionada nas esferas políticas. Basta dizer que o usineiro e senador João Tenório (PSDB) é presidente da Subcomissão dos Biocombustíveis do Senado Federal e integrante da Comissão Interamericana de Etanol, essa, voltada para o fortalecimento da parceria entre Brasil e EUA na produção de etanol. Ou seja, o poder de barganha dos usineiros os mantêm em posição confortável. Permite a eles continuar a ganhar em cima de concessões, benefícios e destruindo os recursos naturais e a biodiversidade, levando de quebra a fama de protetores ambientais e “parceiros de desenvolvimento” no apoio técnico a outras áreas e com projetinhos sociais aqui e acolá.

Não à toa que em ocasião de uma das primeiras reuniões do setor com o governador Teotônio Vilela, no ano passado, o usineiro Jorge Toledo soltou a pérola: “Alagoas não pode fazer mais nada pela cana. A cana-de-açúcar pode fazer por Alagoas. Pode impulsionar outras culturas, outros projetos.”. E assim têm sido.

Governo é governo:
Territórios da Cidadania e PAC alimentam as eleições

Não importa se o governo central é PT, se o estadual é PSDB e o municipal outro qualquer. Governo é governo, e aquele que está a sua frente sabe que o que está em jogo é sua preservação e reprodução, antes de qualquer projeto político-partidário, este, sempre negociável.

Dois programas do governo federal merecem destaque, pois além de manter em pauta a intensificação e a expansão de um modelo econômico concentrador de riqueza para os de cima, vem em aliança a uma articulação política, a uma determinada maneira de conceber a política pública, que desorganiza os de baixo com discurso convidativo de inclusão social. Em uma terra de uma acentuada cultura de clientelismo, tais formas de articular e conceber políticas públicas têm grande serventia na reprodução de grupos e elites políticas.

O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) já teve R$ 2 bilhões aplicados em Alagoas e a meta é de R$ 3 bilhões nos próximos três anos. Especialmente centrado na área de infa-estrutura, as cidades de Rio Largo, Palmeira dos Índios, Arapiraca e a capital Maceió são os principais alvos. Além da obra do Canal do Sertão, cobrindo a área de Arapiraca à Delmiro Gouveia e que é a maior obra hídrica do PAC no Nordeste.

Já o “Territórios da Cidadania”, atinge regiões com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) baixo e o objetivo anunciado é levar “cidadania” às camadas marginalizadas e incentivo à atividades econômicas. Em Alagoas foram definidos três territórios, por critérios de identidade econômica e cultural: Alto Sertão, o Agreste e o Litoral Norte. Seus articuladores juram de pés juntos que vão “erradicar a pobreza no meio rural”.

Percebe-se que os dois programas atuam em dois campos de ação distintos, mas que, naturalmente, estão articulados dentro de um projeto mais amplo. No PAC estão as grandes obras, financiadas por um programa que tem como ponto de apoio o de sempre: arrocho salarial, o corte em despesas de previdência, a flexibilização de leis trabalhistas e ambientais, etc. São obras que possibilitam a construção de infra-estrutura necessária para que empresários e grupos econômicos ganhem em competividade, em lucros.

Cabe também assinalar que o pacote vem também acompanhando da farra de empreiteiras. Não custa mencionar o quanto as grandes licitações viram campos para troca de favores políticos e econômicos entre aqueles que pagam e aqueles que legislam e executam. O exemplo é próximo e recente: o primeiro Secretário de Infra-estrutura do governo de Téo Vilela, o Sr. Adeílson Bezerra, foi pego em 2007 metido nas falcatruas de licitações com a construtora Gautama, inclusive de obras vinculadas ao PAC. Agora, o MPF denunciou o próprio Teotônio.

Pelo lado do programa Territórios da Cidadania, este possui o caráter particular de aplicar os projetos do capital e das elites locais em diálogo com uma maquiagem social, minando os movimentos sociais populares em sua base, os cooptando para dentro do Estado e para projetos agrícolas das elites. Isso porque não está fora em um milímetro sequer de um modelo econômico baseado no agronegócio e no latifúndio. O alvo para atingir regiões mais marginalizadas socialmente e economicamente, não está em contradição com a preservação do latifúndio.

PAC e Territórios da Cidadania, além de alinharem campo e cidade em um mesmo projeto, tende a se reproduzirem através de uma política viciada na relação público/privado, valendo-se do estabelecimento de uma relação clientelista, e onde tudo vira, no mínimo, dividendo eleitoral. Para as prefeituras alagoanas, verdadeiros espaços de enriquecimento rápido e fácil, são programas certeiros para reproduzir e ampliar o domínio político do grupo ou político em questão.

Daí, as verbas destinadas com o PAC e com o programa Territórios da Cidadania viram prato cheio. Apimentando o ano de eleições municipais, seus lançamentos, anúncios e inaugurações são verdadeiras fábricas de palanques para todas as cores, gostos e siglas. Está todo mundo de olho grande, pois é muita grana e são muitas as oportunidades de negócios para os de cima.

A corrupção institucionalizada e os profissionais da política

Na arena do joguete político, seus profissionais têm passado por desgastes e uma quebra de braço entre si e com o poder judiciário. Este último afastou a mesa diretora da Assembléia Legislativa do Estado (ALE), uma decisão inédita, mas estes não perderam sua influência e força na disputa entre blocos e grupos políticos, provocando denúncias e ameaças para todos os lados. São conseqüências da Operação Taturana da Polícia Federal deflagrada no fim de 2007 e que revelou um esquema que desviou da ALE cerca de R$ 300 milhões em cinco anos. O então presidente da ALE, Antônio Albuquerque (ex-DEM), logo foi posto no lugar de maestro do esquema.

Já passaram de dez o número de deputados indiciados em variados delitos, e de cem o de envolvidos em geral. O esquema tem apoio de dentro, inclusive, do Tribunal de Contas e era financiado por empréstimos bancários concedidos aos deputados, em nome da ALE, pelo Sudameris, Banco Rural e o poderoso Bradesco. Dito pela própria PF, a conivência dos bancos foram fundamentais para o esquema. No caso do Bradesco, a quase ausência da pauta na grande mídia nacional, parece encontrar razão na medida em que ele é um dos maiores anunciadores do país.

Voltando aos indiciados, recentemente foi a vez de a bolha estourar no prefeito de Maceió Cícero Almeida (PP) e no deputado Paulão (PT), este, da bancada de oposição e que vinha defendendo a cassação de mandato dos envolvidos. Foram indiciados em quatro processos, entre eles lavagem de dinheiro. Cícero Almeida, de elevada popularidade em Maceió, tomou empréstimo de R$ 120 mil, mas com ares de “inocência” alegou que o dinheiro era para o atual deputado federal Francisco Tenório (então vice-presidente da ALE) financiar a sua fábrica de leite. Já Paulão, presidente estadual do PT, sacou na faixa de R$ 220 mil.

O que se tem revelado é o quão enraizado é a corrupção, um elemento estruturante do próprio regime político-econômico e feito das maneiras mais escandalosas. É uma institucionalização da corrupção que naturaliza a tomada de verba pública para fins privados e na reprodução do poder. Essa institucionalização encontra uma das suas representações, na lei que institui cargos de Secretário Parlamentar associada com a da GAP (Gratificação de Apoio Parlamentar).

Só essas duas leis garantem mais de R$ 100 mil mensais para cada deputado e tudo, segundo eles mesmos, nos conformes da lei. Dinheiro que garante não somente o enriquecimento pessoal e familiar (nomeando funcionários fantasmas e parentes), como também o próprio financiamento eleitoral. Quanto a esta última, o deputado Ricardo Nezinho (PTdoB), até então não mencionado no esquema das taturanas, vira exemplo quando comprou um trio elétrico com esta verba. Não é à toa que os que assumiram o lugar dos deputados afastados, não titubearam e logo trataram de exigir os seus “direitos”.

Nesse sentido, a questão da verba da ALE, seu duodécimo, virou o centro do debate. Proporcionalmente uma das mais custosas do Brasil, não custa lembrar que na época do Governo Lessa (PSB/PDT) o duodécimo foi inchado. Faz parte do receituário de “governabilidade” e é justamente durante este governo que este esquema se iniciou.

Já o Governo Vilela, após os acontecidos, se limitou a alertar por meio da Seplan que o duodécimo esteja compatível com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O detalhe é que Vilela não se lembrou disso quando em seus primeiros dias de governo cortou reajustes de servidores elegendo, especialmente, os professores da rede pública como, na certa, os maiores pesos nas finanças do Estado. Na verdade, o governador tucano ficou na saia justa, visto que Antônio Albuquerque foi um de seus principais cabo eleitorais. Não se meteu publicamente no mérito das discussões que envolvem a Polícia Federal, o que por si só já é uma ajuda aos “taturânicos”, como estão conhecidos.

Na ausência dos deputados afastados, a eleição da mesa diretora elegeu Fernando Toledo (PSDB) e Gilvan Barros (PMN) para os principais cargos, que representa uma demonstração de força política daqueles afastados, pois é a garantia de que as coisas possam caminhar segundo a música ditada por eles. Isso nenhum grande meio de comunicação ousou negar.

Por fim, os bastidores da política profissional alagoana transcende seu território e o indiciamento do próprio presidente estadual do PT abre mais possibilidades para que deixem levar (e olhe lá) somente o anel, mas deixem os dedos, todos eles.

E a organização dos de baixo?

Alagoas tem vivido desde os primeiros dias de 2007 diversas greves de servidores públicos a atingir as áreas de educação, saúde e segurança pública. Junto a isso, a luta pela terra que sempre está à tona, tem agora o adicional de uma certa mobilização dos trabalhadores do corte de cana. Por fim, torna-se público o esquema de corrupção na ALE, envolvendo velhos conhecidos da elite e da pistolagem.

Tomando esses fatos, ao que parece é existir uma grande ebulição, abrindo campo para ser transformada, pelos movimentos e entidades sociais, em um momento de acúmulo de forças a se refletir em aumento do seu poder de pressão e organização, jogando de um lado tanto no desgaste da elite política e suas instituições, quanto na urgência de suas pautas reivindicativas. Não é exatamente isso que ocorre.

No caso do escândalo da Assembléia, a movimentação em torno da questão se deu na formação do MSCC (Movimento Social Contra a Corrupção e a Criminalidade). Reunindo, inicialmente, uma gama de sindicatos, entidades e movimentos populares, o MSCC logo tratou de optar pela ação jurídica e parlamentar, ao invés da de rua. Agora com o indiciamento do presidente estadual do PT, a coisa desanda de vez. A pauta que iniciou na cassação dos envolvidos, antes mesmo deste fato já se centrou para a redução do duodécimo e assim caminha pelo ralo a possibilidade de aglutinar forças sociais para fazer enfrentamento com velhas oligarquias e velhas práticas políticas.

Em relação às greves, o fato de estarmos lidando com um governo tucano não deixa de ser um elemento detonador, na medida em que vários sindicatos e os movimentos sociais de maneira geral estão ligados ao PT. Sabemos que os dois partidos polarizam o cenário político nacional hoje, mesmo se tratando de projetos equivalentes. Se o governo estadual fosse petista, a política seria a mesma em seu mais fundamental e muitos não moveriam uma palha para pôr gente na rua.

De toda forma, as questões referentes ao servidor público se arrastam por anos, em um estado que “vive a sobreviver” de verba federal. Assim, a memória do 17 de julho de 1997, quando o então governador Divaldo Suruagy renunciava após uma situação de vários meses de salários atrasados e mobilização dos setores atingidos, parece atuar no imaginário de todos aqueles que vão lutar por seus direitos. No caso, não se trata de salários atrasados, mas de reajustes.

Sendo que, se a discussão fosse apenas na lógica de quem está ou não está à frente de tal sindicato ou de tal movimento, o cenário seria mais fácil, tanto para fazermos uma análise mais sólida e que apresente “respostas seguras” quanto para resolver a própria questão central: a organização da luta dos de baixo. Porém, para entendermos a situação da luta de classes em Alagoas, é preciso atentar para o caráter das políticas impostas pelo inimigo de classe, a incidência e impacto delas no conjunto dos trabalhadores, tal como o nível de organização autônoma destes.

Para isto, considerando a realidade alagoana, atentamos para o ponto do caráter de cooptação do Estado via programas como Territórios da Cidadania e as políticas pró-biodisel com “inclusão produtiva” dos pequenos agricultores já mencionadas neste documento. Acrescentamos neste bolo o bolsa-família, pois é bastante representativo para a discussão.

As estatísticas acusam que 350 mil famílias alagoanas são assistidas pelo bolsa-família, o que é cerca de metade da população alagoana. Há quem defenda e diga que, ainda que seja uma renda baixa fornecida, considerando a realidade de extrema pobreza dos alagoanos, faz uma diferença importante (que em outras regiões do país pode não existir). Comparando com o que se ganha no corte de cana, seriam R$ 75 milhões por ano deste, contra R$ 300 milhões do bolsa-família nas mãos dos trabalhadores. A comparação é por baixo e sem desconsiderar a necessidade de brigar por medidas que possibilitem melhores condições de vida, ela não passa de puro “economês”.

Tomando também o aspecto político-ideológico, fica claro o quanto o programa atua amarrando a classe e indo bem nas bases dos movimentos populares, em especial os do campo. A questão não está em apelidar ou não o bolsa-família de “bolsa-esmola”. O principal não está no valor fornecido, e sim na sua atuação em desorganizar e desestruturar a ação autônoma da classe, pois, assim como as demais políticas citadas, ele vai lá nas vilas, periferias, em comunidades quilombolas e nos lugares mais carentes. Justo lá, onde boa parte da esquerda tem medo de pisar e ainda “justifica” teoricamente.

Na falta de referências nascidas da experiência de luta, na falta da construção ideológica de um povo que pisa o chão do Quilombo dos Palmares e dos Caetés, como na falta da construção de práticas e métodos que dêem autonomia e protagonismo, o clientelismo, os oportunistas de plantão, o Estado e a direita, deitam e rolam.

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